Treine

01/04/2011 17:37

                Treino é a rotina de todos que abraçam uma modalidade, seja ela da natureza que for: esportiva, marcial, musical, matemática ou outros. O treino aperfeiçoa, pois exige repetição, exige concentração, conscientização e, mais, gera experiência. 

                Falando de Artes Marciais, todo iniciante sente as primeiras dificuldades dos meses de adaptação. Afinal, é algo novo, algo que vai exigir mudanças de postura, de atitude, de mentalidade e, por vezes, até de valores. Apesar de ser o período mais sofrível, é na sequencia desse período que o praticante cresce exponencialmente e é possível observar suas várias mudanças por causa do treino. O bom e o perigoso do iniciante é sua vontade de aprender o quanto antes, tudo, mesmo que não seja maduro para isso. O neófito é sempre cheio de ansiedade de incorporar as técnicas, de compreender os movimentos e realizá-los como se já fizesse isso por anos a fio, querendo aproximar-se ao máximo do conhecimento dos mais antigos. A vontade de aprender é tanta que é normal que se treine com o objetivo de realizar exame de graduação ou para entrar em campeonatos... ou seja, para galgar novas experiências e caminhos.

                Com o passar do tempo e das adaptações necessárias e possíveis, o crescimento do praticante tende a estabilizar na rotina de treino e seu crescimento só é notório para si próprio e para quem o acompanha no dia a dia, pois é um crescimento sutil e esporádico. Passa a não depender só dos novos ensinamentos transmitidos, mas também da sua constante prática e refinamento do conteúdo já visto. Nesse momento, o praticante tende a se tornar entediado, pois ele mesmo não enxerga seu desenvolvimento, sente-se estagnado e envolvido pela rotina. A vontade de aprender técnicas novas continua, é bem verdade, mas agora com o intuito de fugir do que já conhece e do que acredita já ter aprendido.

Por falar nisso, quem acha que já aprendeu, deixa de aprender e, mais grave, deixa de estudar e treinar. Aprendizado é cíclico e contínuo. Cíclico pois estamos constantemente reformulando nossa maneira de ver o mundo e revisitando conceitos e preceitos antigos. Contínuo porque há tanto o que aprender sobre um único fenômeno que o conteúdo não se esgota, em especial, para atividades que são dinâmicas e regidas pela famosa Teoria do Caos, onde não é possível prever todas as variáveis e muito menos controlá-las.

Voltando ao treino propriamente dito, refinamento técnico, ou seja, aperfeiçoamento surge apenas com treino constante e, como já afirmado, só aparecerá sutilmente no praticante. Talvez seja por isso que ouvimos muitas histórias de professores que estão há 30 anos numa Arte Marcial e, toda vez que iniciam o treino, fazem o básico, o fundamental. Muitas vezes estão lado a lado com seu faixa branca, executando os mesmos movimentos. É exatamente nesse instante que nota-se claramente a profunda diferença dos 30 anos de experiência e do refinamento que só o professor que treina pode mostrar na sua postura e na sua atitude, ao lado de seu faixa branca que demonstra, nos mesmos movimentos, insegurança e sua ingenuidade técnica. Após tanto tempo de treino, não se treina mais por objetivos de curto e médio prazo, mas para um verdadeiro caminho de crescimento, não só técnico, como pessoal.

Meu professor dizia que todo treino é um elo que irá compor a corrente (técnica), a cada treino que faltávamos, existiria um elo fraco, quanto mais faltássemos, mais a corrente seria fraca, ou seja, menos a técnica fluiria ou funcionaria em variados oponentes. Quanto mais estivéssemos constantes e presentes, mais a corrente se tornaria forte. Era a forma dele dizer que treinar de vez em quando não serve para nada. Hoje em dia é a forma que eu digo para que treinem para vida. E que afirmo que a cada graduação deve-se treinar mais, pois é mais responsável pelo conhecimento que adquire e também mais responsável por transmitir esse conhecimento de forma correta.

Uma outra vertente do treino é o que o instrutor costuma a fazer: aprender enquanto ensina. Esse tipo de treino é de igual valor, gera um amadurecimento técnico importante, mas não substitui o seu próprio treino físico. Quem treina constantemente torna-se sempre atualizado, podendo gerar melhores condições de aprendizado para os demais e para si mesmo. A falta de treino próprio, independente do nível de conhecimento e experiência, molda técnicas rústicas e falsas impressões no praticante,  pois forjar o espírito é rápido, polí-lo é que demora.